sábado, 24 de janeiro de 2009

SÓCRATES - O PREÇO DE UMA ALMA PERFEITA


Os trabalhos de Sócrates são o grande divisor de águas da Filosofia grega. Ele nasceu em 469 a.c. e não deixou obra escrita. Entretanto criou métodos e teorias tão revolucionários que sua ótica foi imortalizada por seus discípulos (sobre tudo Platão). Sócrates se opunha aos argumentos de várias correntes anteriores, recusando-se a crer que o universo fosse um fenômeno puramente mecânico e sem finalidade, e que nada pudesse ser considerado absoluto.

Apegou-se à idéia de que o mundo era um trabalho de inteligência que se movia em direção a um fim benigno, a que chamou de divino. Subordinava tudo à felicidade humana, considerando-a não como a conquista de um objeto do desejo, mas tentando verificar se essa conquista levaria efetivamente o homem à felicidade. Para ele, a felicidade humana seria encontrada no que chamou de perfeição de alma: em tornar a alma de alguém tão boa quanto possível.

Tomou para si uma máxima inscrita no Oráculo de Apolo, na cidade de Delfos, que dizia: Conhece-te a ti mesmo. Para Sócrates, o aprimoramento da alma derivaria, antes de qualquer coisa, do autoconhecimento. Seu método investigativo era a maiêutica, que consistia no exaustivo questionamento de uma idéia ou de um ponto de vista, até que ele não pudesse mais ser posto em dúvida. Então, considerava ter chegado a uma verdade essencial e incondicionalmente válida. O filósofo arrebanhou e arrebatou multidões de jovens que não o encaravam apenas como um mestre, mas como um companheiro de viagem na busca de respostas a vários questionamentos.

Sócrates jamais assumiu a condição de mestre. Seus discípulos e as idéias que deles emanavam eram para ele tão importantes quanto suas próprias, e considerava a si mesmo um indagador para quem todas as questões ainda estavam em aberto. Incitava os jovens a questionar todas as normas de conduta recebidas, animando-os a julgar por si qualquer questão moral. Infelizmente, seus métodos foram considerados corruptores: ao tentar fazer a juventude tomar contato mais pleno com suas potencialidades, ele abalava a moralidade repressiva e alguns dos questionáveis sustentáculos daquela sociedade. Por isso e por sua idéia da existência de um princípio benigno uno (que julgavam uma negação das divindades reconhecidas por aquele mundo politeísta), foi condenado ao suicídio pela ingestão de cicuta, um veneno letal.

Seus discípulos, indignados e entristecidos com a sentença, tentaram planejar uma fuga, e houve quem lhe sugerisse a desistência da busca da sabedoria, o que ele considerava sua missão. Mas Sócrates manteve-se fiel a seus princípios. A sentença foi executada em 399 a.c. Na Apologia, Platão reproduz o que teria sido a resposta de seu mestre à sugestão de desistência.

"- Se vocês se oferecessem para me absolver nestes termos, minha resposta seria: 'Atenienses, eu os tenho com muito afeto e estima; mas obedecerei aos céus e não a vocês, nunca deixarei de procurar a sabedoria ou de aconselhá-los com minhas palavras habituais e mostrar a verdade a qualquer um de vocês que eu porventura encontre: Meu bom amigo, você é um cidadão de Atenas, uma grande cidade, famosa pela sabedoria e força; você não tem vergonha de se preocupar tanto em acumular riqueza, honra e reputação, enquanto em nada se importa com a sabedoria e a verdade e a perfeição de sua alma?

E se ele protestar, dizendo que realmente se importa com essas coisas, não o deixarei logo em seguida e seguirei meu caminho; eu o questionarei, interrogá-lo-ei minuciosa e rigorosamente, testá-lo-ei e, se ele não possuir a virtude que aparenta, eu o censurarei por não dar valor às coisas mais preciosas e se afeiçoar às coisas sem valor. Isso farei com todos que encontrar, jovem ou velho, citadino ou estranho, mas especialmente com meus caros cidadãos, visto que vocês são meu próprio povo. Porque estou convencido de que tal coisa é uma ordem do céu; e acredito que porção de sorte melhor do que meu alistamento no serviço dos céus jamais aconteceu com vocês. Porque não tenho nenhuma outra atividade a não ser ir de um lado para outro persuadindo todos vocês, tanto jovens como velhos, a se importarem menos com seus corpos e suas riquezas do que com a perfeição de suas almas, e tornar isso a sua primeira preocupação, e dizendo-lhes que a bondade não vem da riqueza, mas é a bondade que faz da riqueza ou de qualquer outra coisa, na vida privada ou pública, algo de valor para o homem. Se ao dizer isso estou desencaminhando jovens, tanto pior; mas se for declarado que tenho qualquer outra coisa a dizer, então isso não é verdade. Portanto, Atenienses; devo concluir, 'vocês podem ou não prestar atenção em Anytus; vocês podem ou não me absolver; mas não mudarei meus caminhos, mesmo que tivesse que morrer mil mortes”.
Revista Discutindo Literatura

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